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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

A salvação vem do descarte

Segunda-feira 1 de Junho de 2015

 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 23 de 4 de Junho de 2015  

Deus dá sempre vida a uma «história de amor» com cada um de nós. E não obstante as que parecem ser «falências», pequenas e grandes, no final aquele «sonho de amor» vence. Precisamente este nosso caminho por uma «estrada difícil», com um Deus que salva através do que é descartado, foi reproposto por Francisco.

Para o Papa, a parábola dos camponeses e do dono da vinha, narrada por Marcos no trecho evangélico (12, 1-12) proposto pela liturgia, «é uma síntese da história da salvação que Jesus faz — como ouvimos — aos chefes dos sacerdotes, aos escribas e aos anciãos: ou seja, à liderança do povo de Israel, a quantos governavam o povo, aos destinatários da promessa de Deus».

E «é uma bonita parábola», realçou o Pontífice, que «começa com um sonho, um projecto de amor: aquele homem que plantou uma vinha, cercou-a com uma sebe, cavou nela um lagar» e edificou uma torre. Foi «feito tudo com amor». De facto, o homem «amava este rebento de vinha» e, por conseguinte, «aluga-a, entrega-a» para que dê fruto. Depois, «no momento oportuno manda um servo aos vinhateiros, para receber deles uma parte do produto da vinha e daí começa tudo o que ouvimos: um foi espancado, outro ferido e o terceiro morto». Por fim, «envia o seu filho» mas aqueles camponeses «matam-no: assim termina a história».

Afinal de contas, explicou o Papa, «esta história que parece uma história de amor, que devia ir em frente com passos de amor entre Deus e o seu povo», ao contrário, mostra-se «uma história de falências». A ponto que «Deus — o Pai do povo, que elege este povo para si porque é um povo pequeno e o ama, sonha com amor — parece falhar». E «esta história de salvação pode ser chamada história da falência». Mas «a falência — disse o Pontífice — inicia desde o primeiro momento e também nesta falência do sonho de Deus, desde o começo, há o sangue — o sangue de Abel — e a partir dali continua: o sangue de todos os profetas que foram falar ao povo, que ajudaram a preservar a vinha, até ao sangue do seu Filho». Contudo, acrescentou Francisco, «há no final uma palavra de Deus, que nos faz pensar».

«O que fará portanto o dono da vinha?», questionou-se Francisco. E respondeu: «Virá e porá o povo diante do julgamento». A este propósito Jesus diz «uma palavra que parece um pouco fora do lugar: “Não lestes esta Escritura? A pedra que os construtores descartaram tornou-se a pedra angular. Isto foi feito pelo Senhor e é uma maravilha aos nossos olhos”». Por conseguinte, o Papa esclareceu que «aquela história de falência se inverte e o que foi descartado torna-se força». Assim «os profetas, os homens de Deus que falaram ao povo, que não foram ouvidos, que foram descartados, serão a sua glória». E «o filho, o último enviado, que foi realmente descartado, julgado, não ouvido e assassinado, tornou-se a pedra angular». Eis então que «esta história, que começa com um sinal de amor e se assemelha a uma história de amor, mas depois parece findar numa história de falência, acaba com o grande amor de Deus, que do descarte tira a salvação; mediante o seu Filho descartado, salva-nos a todos».

Para o Pontífice foi uma bela experiência «ler na Bíblia tantas, tantas lamentações de Deus». Aliás, «quando Deus fala ao seu povo diz: “Mas por que fazes isto? Lembra-te de tudo o que foi feito por ti: como te escolhi, como te libertei. Mas por que me fazes isto?”». E «no final» há precisamente «aquele pranto de Jesus sobre Jerusalém: «Jerusalém, Jerusalém, que matas os teus profetas”». Esta, explicou, «é a história de um povo que não consegue libertar-se daquele desejo que semeou Satanás nos primeiros pais: tornar-vos-eis deuses». É «um povo que não sabe obedecer a Deus, porque por sua vez quer ser deus».

Esta atitude torna-o «um povo fechado, um povo no qual os ministros se endurecem». Portanto, observou o Papa, «o final deste trecho, que lemos, é triste», porque sobressai «a rigidez daqueles sacerdotes, daqueles doutores da lei: tentavam capturar Jesus para o matar, mas tiveram medo da multidão». Com efeito, «compreenderam que ele tinha pronunciado aquela parábola contra eles». E portanto «deixaram-no e foram-se embora».

«O caminho da nossa redenção é uma estrada na qual não faltam falências», reconheceu o Pontífice. A ponto que «também a última, a da Cruz, é um escândalo: mas precisamente ali o amor vence». E «aquela história que começa com um sonho de amor, e continua com uma história de falências, finda na vitória do amor: a cruz de Jesus». O Papa Francisco convidou a «não esquecer este caminho», embora seja «um percurso difícil». Mas «também o nosso» é sempre um caminho difícil. Assim, «se cada um de nós fizer um exame de consciência, verá quantas vezes mandou embora os profetas; quantas vezes disse a Jesus: “Vai-te embora!”: quantas vezes quis salvar-se a si mesmo; quantas vezes pensou que era justo».

«O amor de Deus para com o seu povo manifesta-se no sacrifício do seu Filho que agora vamos celebrar outra vez, verdadeiramente», disse Francisco antes de retomar a celebração eucarística. «E quando Ele descer sobre o altar e nós o oferecermos ao Pai — acrescentou — far-nos-á bem recordar esta história de amor que parece falhar, mas no final vence». Por conseguinte, é importante «fazer memória, na história da nossa vida, daquela semente de amor que Deus lançou em nós». E, por conseguinte, «fazer o que fez Jesus em nosso nome: humilhou-se». E assim também a nós, concluiu, «far-nos-á bem humilhar-nos diante deste Senhor que agora vem para celebrar connosco o memorial da sua vitória».

 



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