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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA CASA SANTA MARTA

Três pequenas coisas para fazer a paz

  Sexta-feira, 26 de outubro de 2018

 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 45 de 6 de novembro de 2018

Magnanimidade, doçura, humildade: são as atitudes simples, as «pequenas coisas» — indicadas por São Paulo a uma comunidade cristã das origens, a de Éfeso — ainda hoje eficazes para «fazer» e «consolidar a unidade» no mundo, nas sociedades humanas e nas famílias que «precisam de paz». O Papa repropô-las durante a missa, partindo da primeira leitura tirada da carta do apóstolo aos Efésios (4, 1-6).

«Paulo está na prisão» e «dirige-se aos cristãos com este — podemos dizer — “hino” à unidade» antecipou o Pontífice descrevendo a cena antes de falar acerca de outro aspeto em particular: a solidão do protagonista. «Ele — constatou — está sozinho. Um pouco antes deste trecho, lamenta-me: “Deixaram-se sozinho”. Depois diz a Tito: “Na minha primeira audiência diante do juiz ninguém me assistiu”. Sozinho. E aquela solidão de prisioneiro condenado à morte certamente o acompanhará até às Três Fontes», onde «morrerá sozinho, porque os cristãos estão muito ocupados “na frente interna”, nas lutas internas».

Eis por que, observou o Pontífice, «Saulo dá o melhor de si neste excerto» haurindo de todas as energias que lhe restam «para convocar para a unidade, para recordar a dignidade da vocação: “Comportai-vos de maneira digna da chamada que recebestes”. Rumo à unidade». De resto, «o próprio Jesus, antes de morrer, na última Ceia, pediu ao Pai a graça da unidade para todos nós: “Que sejam um, como Tu e eu, Pai”». E isto contém uma lição também para a humanidade de hoje. Uma lição que Francisco repropôs atualizando a reflexão: «Nós estamos habituados a respirar o ar dos conflitos. Todos os dias, no telejornal, nos jornais, se fala dos conflitos, um atrás do outro, de guerras, sem paz, sem unidade, um contra o outro». A ponto que, foi a sua denúncia, «mesmo se estabelecem pactos para pôr fim a qualquer conflito, como dizia um sábio: “Os pactos fazem-se para serem desfeitos em seguida”. E assim sobre o que foi assinado há dez anos, depois diz-se: “Não, não continuamos com este pacto”».

Deste modo, o que vai em frente são «a corrida aos armamentos, a preparação para as guerras, a destruição». Com o resultado, observou o Papa, que «também as instituições mundiais — vemos hoje — criadas com a melhor das vontades de ajudar a unidade da humanidade, para a paz, sentem-se incapazes de encontrar um acordo: que há um veto aqui, um interesse lá... E têm dificuldade de encontrar acordos de paz». Mas, em tudo isto, admoestou Francisco, «entretanto as crianças não têm o que comer, não vão à escola» e não são «educadas; não há hospitais porque as guerras destroem tudo». Em definitiva, «nós tendemos à destruição, à guerra, à desunião». E «é a tendência que semeia no nosso coração o inimigo, o destruidor da humanidade: o diabo».

Eis então a validade perene do ensinamento paulino, que «aqui, neste excerto — comentou o Papa — nos ensina o caminho rumo à unidade». Com efeito, afirma que «a unidade está coberta, está “blindada” — podemos dizer — com o vínculo da paz». Ou seja, esclareceu Francisco, «a paz leva à unidade». Para a alcançarmos, o apóstolo «ensina-nos o caminho simples: “Comportai-vos de maneira digna da chamada que recebestes, com toda a humildade, doçura e magnanimidade”».

Eis portanto as «três coisas» indicadas por Paulo «para construir a paz, a unidade entre nós: “humildade, doçura — nós que estamos habituados a insultar-nos, a gritar uns contra os outros... doçura — e magnanimidade”». Como se disséssemos: «Deixa estar, abre o coração».

Mas, questionou-se o Pontífice, «podemos construir a paz no mundo com estas três pequenas coisas»? A resposta não podia deixar de ser afirmativa: «Sim, é o caminho. Podemos chegar à unidade? Sim, aquele caminho: “humildade, doçura e magnanimidade”». E dado que «Paulo é prático», no trecho bíblico «continua com um conselho muito concreto: “suportando-vos reciprocamente no amor”. Suportar-nos uns aos outros». Um conselho que «não é fácil» de concretizar no dia a dia. O Papa disse estar ciente disto, fazendo notar «que há sempre o julgamento, a condenação, que leva à separação, à distância. Quantas vezes — observou — se pergunta a uma pessoa: “Como está a tua família? Como estão os teus primos?”. Não, não, não nos frequentamos...” E o diabo fica feliz com isto. É o início da guerra, pois não sois capazes de vos suportar».

Insistindo acerca da origem “doméstica” dos conflitos, o Papa frisou que esta dimensão é «um aspeto que começa de manhã, quando nos levantamos, e acaba à noite quando vamos dormir». Por isso é necessário «que nos suportemos, pois todos nós causamos incómodo, impaciência, porque todos nós somos pecadores, todos temos os nossos defeitos. Mas suportar: é um lindo caminho, simples, preocupando-se: “Porque fiz isto?” diz Paulo, “tendo a solicitude de preservar a unidade do espírito por meio do vínculo da paz”. Se eu quiser conservar a unidade, tenho que fazer estas coisas simples, não há grandes receitas».

Prosseguindo o comentário ao trecho paulino, o Papa explicou a seguir que o autor da carta aos Efésios «vai mais além, certamente sob a inspiração das palavras de Jesus na última Ceia: “Um só corpo e um só espírito, assim como uma só é a esperança à qual sois chamados, a da vossa vocação; um só Senhor, uma só fé, um só batismo. Um só Deus e Pai de todos, que está acima de todos, age por meio de todos e está presente em todos”». Por conseguinte, Paulo «entusiasma-se e vai em frente: e da doçura, da humildade, da magnanimidade, depois vai em frente e mostra-nos o horizonte da paz com Deus; como Jesus nos mostrou o horizonte da paz na oração: “Pai, que sejam um, como tu e eu”. A unidade. E assim vai-se em frente passo após passo».

Em seguida, referindo-se ao excerto do Evangelho do dia, tirado de Lucas (12, 54-59), o Papa constatou como Jesus é «prático com este conselho que ouvimos: “Quando fores com o teu adversário diante do magistrado — discutir — ao longo do caminho procura encontrar um acordo com ele”». E definiu o de Jesus um «bom conselho», porque «não é difícil encontrar um acordo no início do conflito. Não é difícil». É suficiente pensar a este propósito «nos esposos, quando discutem, até quando os pratos voam, e há ar de tempestade em casa»: com efeito, naquelas situações «o conselho melhor a dar-lhes é: “Sim, sim, atirai os pratos todos, mas não termineis o dia sem fazer as pazes”. Porquê? Porque a guerra fria no dia seguinte é muito perigosa. O conselho de Jesus: põe-te de acordo no início, fazer a paz no início: isto é humildade, doçura, magnanimidade. Pode-se construir a paz no mundo inteiro com estas pequenas coisas, pois estas atitudes são a atitude de Jesus: humilde, manso, perdoa tudo».

Eis, portanto, o pedido final de Francisco: «hoje o mundo — concluiu — precisa de paz, nós temos necessidade de paz, as nossas famílias precisam de paz, a nossa sociedade tem necessidade de paz. Comecemos em casa a praticar estas coisas simples: magnanimidade, doçura, humildade. Vamos em frente por este caminho: fazer sempre a unidade, consolidar a unidade». Com os votos de «que o Senhor nos ajude neste caminho».

 



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