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VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA JOÃO PAULO II
À REPÚBLICA DOMINICANA, MÉXICO E BAHAMAS
[25 DE JANEIRO - 1º DE FEVEREIRO DE 1979]

HOMILIA DO SANTO PADRE
NA MISSA POR OCASIÃO DA INAUGURAÇÃO
DA III CONFERÊNCIA GERAL DO EPISCOPADO
 LATINO-AMERICANO

Basílica de Nossa Senhora de Guadalupe
27 de Janeiro de 1979

 

1. Salve, Maria!

Quão profunda é a minha alegria, queridos Irmãos no Episcopado e amadíssimos Filhos, pelo facto de os primeiros passos da minha peregrinação, como Sucessor de Paulo VI e de João Paulo I, me terem trazido precisamente aqui. Me terem trazido até junto de Ti, Maria, a este Santuário do povo do México e de toda a América Latina, onde desde há tantos séculos se manifestou a Tua maternidade!

Salve, Maria!

Pronuncio com imenso amor e com reverência estas palavras, tão simples e ao mesmo tempo tão maravilhosas. Ninguém Te poderá saudar nunca de modo mais estupendo do que o fez um dia o Arcanjo no momento da Anunciação: "Ave Maria, gratia plena, Dominus tecum". Eu repito estas palavras, que tantos corações guardam e tantos lábios pronunciam em todo o mundo. Nós, os aqui presentes, repetimo-las juntos, conscientes do que são estas palavras com as quais o próprio Deus, através do seu mensageiro, Te saudou a Ti, a Mulher prometida no Éden e desde toda a eternidade eleita corno Mãe do Verbo, Mãe da divina Sabedoria, Mãe do Filho de Deus.

Salve, Mãe de Deus!

2. O teu Filho Jesus Cristo é o nosso Redentor e Senhor. É o nosso Mestre. Todos nós aqui reunidos somos seus discípulos. Somos os sucessores dos Apóstolos, daqueles a quem o mesmo Senhor disse: Ide, pois, ensinai todas as gentes, baptizando-as em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a observar tudo o que vos mandei. E eis que Eu estou convosco todos os dias até ao fim do mundo (Mt. 28, 19-20).

Congregados aqui, o Sucessor de Pedro e estes sucessores dos Apóstolos, damo-nos conta de corno tais palavras se cumpriram, de maneira admirável, nesta terra. Com efeito, desde que em 1492 começa a gesta evangelizadora no Novo Mundo, passam apenas vinte anos até chegar ao México a fé. Pouco mais tarde é criada a primeira sede arquiepiscopal, regida por Juan Zumárraga, ao qual secundaram outras grandes figuras de evangelizadores, que difundiram o Cristianismo em zonas muito vastas.

Outras epopeias religiosas não menos gloriosas escreverão no hemisfério sul homens como um Santo Toríbio de Mogroviejo e muitos outros que mereceriam ser citados em lista assaz longa. Os caminhos da fé vão-se alargando sem cessar; e no final do primeiro século de evangelização as sedes episcopais no novo Continente já são mais de setenta, compreendendo uns quatro milhões de cristãos. Uma empresa singular, esta, que se continuará por muito tempo, até abarcar hoje em dia, após cinco séculos de evangelização, quase metade de toda a Igreja Católica, arraigada na cultura do povo latino-americano e formando parte da sua identidade própria.

E à medida que nestas terras se ia realizando o mandato de Cristo, à medida que, com a graça do Baptismo, se iam multiplicando por toda a parte os filhos da adopção divina, aparecia também a Mãe. Com efeito, a Ti, Maria, o Filho de Deus e ao mesmo tempo Teu Filho, do alto da Cruz indicou um homem e disse: Mulher, eis o teu filho! (Jo. 19, 26). E naquele homem Ele Te confiou cada um dos homens, confiou-Te os homens todos. E Tu, que no momento da Anunciação concentraste todo o programa da Tua vida nestas simples palavras — eis a serva do Senhor! Faça-se em Mim segundo a tua palavra (Lc. 1, 38) —  Tu, todos abraças, de todos Te aproximas, a todos procuras atrair maternalmente. Deste modo se realiza aquilo que o último Concílio declarou acerca da Tua presença no mistério de Cristo e da Igreja. Continuas a estar de maneira admirável no mistério de Cristo, Teu Filho unigénito, porque estás sempre onde quer que estejam os homens seus irmãos, onde quer que esteja a Igreja.

3. Os primeiros missionários chegados à América, de facto, provenientes de terras de eminente tradição mariana, conjuntamente com os rudimentos da fé cristã vão ensinando também o amor a Ti, Mãe de Jesus e de todos os homens. E a partir do momento em que o índio Juan Diego falou da doce Senhora de Tepeyac, Tu, Mãe de Guadalupe, entras de modo determinante na vida cristã do povo do México. Não de menor alcance foi a Tua presença noutras partes, onde os Teus filhos te invocam com nomes cheios de ternura, como Nossa Senhora da Altagraça, da Aparecida, de Luján e tantos outros não menos queridos, para não fazer uma lista interminável dos nomes com que, em cada Nação e mesmo em cada zona geográfica, os povos latino-americanos Te exprimem a sua devoção mais profunda e Tu os proteges no seu peregrinar na fé.

O Papa — que provém também ele de um País onde as tuas imagens, especialmente uma, a de Jasna Góra, são sinal igualmente da Tua presença na vida da nação e nas alternativas da sua história — é particularmente sensível a este sinal da Tua presença aqui, na vida do Povo de Deus no México, na sua história, também esta não fácil e por vezes até dramática. Mas estás igualmente presente na vida de tantos outros povos e nações da América Latina, presidindo e guiando não somente o seu passado remoto ou recente, mas também o momento actual, com as suas incertezas e sombras. Este Papa percebe no fundo do seu coração os vínculos particulares que Te unem a Ti com este Povo e a este Povo contigo. Sim: este Povo, que afectuosamente Te chama "La Morenita"; este Povo — e indirectamente todo este imenso Continente — vive a sua unidade espiritual graças ao facto de Tu seres a Mãe. Uma Mãe que, com o seu amor, cria, conserva e aumenta espaços de aproximação recíproca entre os seus filhos.

Salve, Mãe do México! Mãe da América Latina!

4. Nós encontramo-nos aqui nesta hora insólita e maravilhosa da história do mundo. Chegámos a este lugar, conscientes de nos acharmos num momento crucial. Com esta reunião de Bispos desejamos reenlaçar-nos com a precedente Conferência do Episcopado Latino-americano que se realizou há dez anos atrás em Medellín, em coincidência com o Congresso Eucarístico de Bogotá, e na qual participou o Papa Paulo VI, de inolvidável memória. Viemos aqui, não tanto para tornar a examinar, passados dez anos, o mesmo problema, quanto para o rever de um modo novo, num novo lugar e num novo momento histórico.

Queremos tomar como ponto de partida o que se acha contido nos documentos e resoluções daquela outra Conferência. E queremos, por outro lado, sobre a base das experiências destes dez anos, do desenvolvimento do modo de pensar e à luz das experiências de toda a Igreja, dar um justo e necessário passo em frente.

Realizou-se a Conferência de Medellín pouco depois do encerramento do II Concílio do Vaticano, o Concílio do nosso século; e teve como objectivo coligir as posições peculiares e conteúdo essencial do mesmo Concílio, a fim de aplicá-los e fazer deles uma força orientadora na situação concreta da Igreja Latino-americana.

Sem o Concílio não teria sido possível a reunião de Medellín, que intentou ser um impulso de renovação pastoral, um novo "espírito" em ordem ao futuro, em plena fidelidade eclesial na interpretação dos sinais dos tempos na América Latina. A intencionalidade evangelizadora era bem clara e resta patente nos dezasseis temas tratados, reunidos em torno de três grandes áreas, mutuamente complementares: promoção humana, evangelização e crescimento na fé, Igreja visível e suas estruturas.

Com a sua opção pelo homem latino-americano encarado na sua integridade, com o seu amor preferencial mas não exclusivo pelos pobres, com o seu alento a uma libertação integral dos homens e dos povos, Medellín, a Igreja ali presente, foi uma chamada de esperança para metas mais cristãs e mais humanas.

Entretanto passaram mais de dez anos. E fizeram-se interpretações, às vezes contraditórias, nem sempre correctas e nem sempre benéficas para a Igreja. Por isso, a Igreja põe-se à procura dos caminhos que lhe permitam compreender mais profundamente e cumprir com maior empenho a missão recebida de Cristo Jesus.

Neste sentido tiveram grande importância as sessões do Sínodo dos Bispos que se realizaram nestes anos, sobretudo a reunião do ano de 1974, centrada sobre a Evangelização, cujas conclusões foram coligidas depois, de modo vivo e alentador, pela. Exortação Apostólica Evangelii nuntiandi de Paulo VI.

Este é o tema que hoje colocamos sobre a nossa mesa de trabalho, ao propor-nos estudar "A Evangelização no presente e no futuro da América Latina".

Encontrando-nos neste lugar santo para iniciar os nossos trabalhos, representa-se-nos ante o olhar o Cenáculo de Jerusalém, local da instituição da Eucaristia. Ao mesmo Cenáculo tornaram os Apóstolos depois da Ascensão do Senhor, a fim de aí, permenecendo em oração com Maria, a Mãe de Cristo, poderem preparar os seus corações para receber o Espírito Santo, no momento do nascimento da Igreja.

Também nós vimos aqui para isso, também nós esperamos a descida do Espírito Santo, que nos fará ver os caminhos da evangelização, através dos quais a Igreja deve continuar e renascer neste nosso grande Continente. Também nós hoje, e nos próximos dias, desejamos permanecer em oração com Maria, Mãe de nosso Senhor e Mestre: contigo, Mãe da esperança, Mãe de Guadalupe.

5. Permite-me, pois, que eu, João Paulo II, Bispo de Roma e Papa, juntamente com os meus Irmãos no Episcopado que representam a Igreja do México e de toda a América Latina, neste momento solene, confiemos e Te ofereçamos a Ti, serva do Senhor, todo o património do Evangelho, da Cruz e da Ressurreição, de que nós todos somos testemunhas, apóstolos, mestres e bispos.

Oração

Ó Mãe!
Ajuda-nos a ser fiéis dispensadores dos grandes mistérios de Deus.
Ajuda-nos a ensinar a verdade que Teu Filho anunciou e a difundir o amor, que é o principal mandamento e o primeiro fruto do Espírito Santo.
Ajuda-nos a confirmar os nossos irmãos na fé
e ajuda-nos a despertar a esperança na vida eterna.
Ajuda-nos a guardar os grandes tesouros encerrados nas almas do Povo de Deus que nos foi confiado.

Nós Te oferecemos todo este Povo de Deus.
Oferecemos-Te a Igreja do México e de todo o Continente;
e oferecemos-T'a como propriedade Tua.
Tu que entraste estavelmente no mais íntimo dos corações dos fiéis
através do sinal da Tua presença,
que é a Tua imagem no Santuário de Guadalupe,
vive como em tua casa nestes corações,
também daqui para o futuro.
Sê um de casa nas nossas famílias, nas nossas paróquias,
missões, dioceses e em todos os povos.

E fá-lo por meio da Igreja Santa, a qual, imitando-Te a Ti, Mãe,
deseja ser cada vez mais uma boa mãe,
cuidar das almas em todas as suas necessidades,
anunciando o Evangelho,
administrando os Sacramentos,
salvaguardando a vida das famílias mediante o sacramento do Matrimónio,
reunindo todos na comunidade eucarística por meio do Santíssimo Sacramento do altar
e acompanhando-os com amor desde o berço até à entrada na eternidade.

Ó Mãe!
Desperta nas jovens gerações a disponibilidade para o exclusivo serviço de Deus.
Implora para nós abundantes vocações locais para o sacerdócio e para a vida consagrada.

Ó Mãe!
Corrobora a fé de todos os nossos irmãos e irmãs leigos,
para que em todos os diversos campos da vida social, profissional, cultural e política
actuem de acordo com a verdade e a lei que o Teu Filho veio trazer à humanidade,
a fim de conduzirem a todos à salvação eterna e, ao mesmo tempo,
a fim de tornarem a vida sobre a terra mais humana e mais digna do homem.

A Igreja que desenvolve a sua actividade entre as nações americanas,
a Igreja no México, quer servir, com todas as suas forças,
esta causa sublime com renovado espírito missionário.

Ó Mãe!
Faz com que saibamos servi-la na verdade e na justiça.
Faz com que nós mesmos sigamos este caminho e por ele conduzamos os demais,
sem jamais nos desviarmos por atalhos tortuosos, arrastando connosco os outros.

Nós Te oferecemos e a Ti confiamos
todos aqueles e tudo aquilo
que é objecto da nossa responsabilidade pastoral,
confiando em que Tu hás-de estar connosco
e nos ajudarás a realizar aquilo que o Teu Filho nos mandou fazer (Cfr. Jo. 2, 5).
Depositamos em Ti esta confiança ilimitada;
e com ela, eu, João Paulo II,
juntamente com todos os meus Irmãos no Episcopado
 do México e da América Latina,
queremos vincular-Te de um modo ainda mais forte ao nosso ministério,
à Igreja e à vida das nossas nações.
Desejamos pôr nas Tuas mãos todo o nosso porvir,
o porvir da evangelização na América Latina.

Rainha dos Apóstolos!
Aceita a nossa prontidão para servir sem reservas a causa do Teu Filho,
a causa do Evangelho e a causa da paz,
baseada na justiça e no amor entre os homens e entre os Povos.

Rainha da Paz!
Salva as Nações e os Povos do inteiro Continente,
que confiam em Ti, das guerras, do ódio e da subversão.

Faz com que todos,
governantes e súbditos,
aprendam a viver em paz,
se eduquem para a paz,
façam tudo aquilo que exige a justiça e o respeito pelos direitos de todo o homem,
para que se consolide a paz.

Aceita esta nossa confiada entrega,
ó serva do Senhor!
Que a Tua maternal presença no mistério de Cristo e da Igreja
se converta em fonte de alegria e de liberdade para cada um e para todos;
fonte daquela liberdade por meio da qual Cristo nos libertou (Gál. 5, 1),
e finalmente fonte daquela paz que o mundo não pode dar,
mas que somente a dá Ele, Cristo (Cfr. Jo. 14, 27).

Finalmente, ó Mãe,
recordando e confirmando o gesto dos meus Predecessores Bento XIV e Pio X,
que Te proclamaram Padroeira do México e de toda a América Latina,
eu Te apresento um diadema em nome de todos os Teus filhos mexicanos e latino-americanos,
para que os conserves debaixo da Tua protecção
e guardes a sua concórdia na fé e a sua fidelidade
a Cristo, Teu Filho, Ámen!

 



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