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CARTA DO PAPA JOÃO PAULO II
AOS BISPOS DE EL SALVADOR

Queridos Irmãos no Episcopado

Na solenidade da Transfiguração do Senhor, festa tão querida para a vossa Nação, que tem o nome de Cristo Salvador e que O elegeu como Patrono, desejo uma vez mais dirigir-vos. Veneráveis Irmãos no Episcopado, uma palavra de apoio e alento na vossa actividade pastoral. Com ela vos renovo o testemunho da minha afectuosa solicitude e a participação nas vossas ansiedades e preocupações. Esta palavra quer ser sobretudo um reiterado chamamento à paz e à reconciliação.

Vós não ignorais, e no passado o demonstrastes, que entre os vários aspectos da missão de cada Bispo — como eu recordava ao Episcopado da Argentina na minha recente viagem -— um dos mais salientes e urgentes é o de revelar-se como "agente de harmonia, de paz e de reconciliação" não só no âmbito da Igreja, para salvaguardar e robustecer os vínculos da unidade, mas também no interior da comunidade nacional diante de rupturas e contrastes que não podem deixar de preocupar o vosso ânimo de Pastores, portadores de uma mensagem de salvação que chama à fraternidade e à solidariedade humanas.

Renovando-vos esta exortação, dou-me perfeitamente conta de que as discórdias e as divisões que perturbam ainda o vosso País e causam novos conflitos e violências, encontram a sua raiz verdadeira e profunda nas situações de injustiça social: problema que surgiu com energia a nível político, mas que é sobretudo de natureza ética.

A metodologia da violência que levou a uma guerra fratricida — situando, por um lado, todos os que vêem na luta armada um instrumento necessário para conseguir uma nova ordem social e, por outro lado, todos os que recorrem aos princípios da "segurança nacional" para legitimar repressões brutais —, não encontra justificação racional, e muito menos cristã.

Diante dos métodos da violência torna-se necessário estabelecer os métodos da paz, que "deve realizar-se na verdade, deve construir-se sobre a Justiça, deve ser animada pelo amor, deve construir-se na liberdade" (cf. Mensagem para o Dia Mundial da Paz, 1" de Janeiro de 1981).

Sabeis muito bem, Veneráveis Irmãos, que a Igreja, sempre solícita em favor do homem em toda a sua integridade e dignidade (Redemptor hominis, n. 13-14), guarda e alimenta esses valores; constrói sobre eles sólida defesa dos direitos da pessoa humana (Ibid., 17) e da própria identidade moral e cultural de uma nação cristã; recorre a eles, para constituir a força moral de um País, quando se trata de vencer crises de importância moral, antes ainda que social.

Faço-me portanto intérprete, em união convosco, das profundas aspirações do vosso povo, desejoso há tempos de ver convertidos em realidade os genuínos conceitos de liberdade, de dignidade da pessoa humana, de justiça social, que se fundam no duplo aspecto do amor: para com Deus, Pai providente e dador de todo o bem, e para com os irmãos.

Aos vossos fiéis, sedentos de verdade e de justiça, continuai a oferecer lhes com todo o fervor e entusiasmo os ensinamentos próprios da doutrina social da Igreja, movidos por uma viva solicitude para com os sofrimentos da Nação, concordantes em propor uma resposta adequada às exigências do momento actual, unidos por um renovado impulso na vossa actividade pastoral.

Nas novas perspectivas institucionais abertas ao País nos últimos tempos torna-se deste modo mais urgente o propósito de encarnar os métodos da paz no ministério da reconciliação, através da palavra do Evangelho e da acção que se inspira no mesmo.

A reconciliação não é sinal de debilidade ou de vileza; nem é renúncia à devida justiça ou à defesa dos pobres e dos marginalizados; é um encontro entre irmãos dispostos a vencer a tentação do egoísmo e a renunciar aos intentos de pseudojustiça; é fruto de sentimentos fortes, nobres e generosos, que levam a estabelecer uma convivência fundada sobre o respeito de cada Individuo e dos valores próprios de cada sociedade civil.

Essa reconciliação, portanto, deve poder realizar-se a todos os níveis e, antes de tudo, entre irmãos que empenham as armas, movidos por interesses contrários e guiados por ideologias que sacrificam as aspirações fundamentais da pessoa humana. Para uns e outros, condição indispensável da reconciliação é cessar toda a hostilidade e renunciar ao uso das armas com a garantia segura de que ninguém será objecto de represália ou de vingança depois de ter dado a própria adesão ao nobre intento de reunir esforços e iniciativas que assegurem ao País uma vitalidade renovada e um progresso ordenado.

A reconciliação deve realizar-se também no âmbito da família, a que dedicastes particular atenção na Carta Pastoral Colectiva de 24 de Dezembro do ano passado; nas paróquias e outros sectores mais vastos da Igreja; nos ambientes de trabalho, onde com tanta frequência se. exacerbam os problemas humanos que atormentam a comunidade nacional.

Vós, Veneráveis Irmãos no Episcopado, — e convosco os vossos colaboradores —, estais chamados a ser ministros e testemunhas da obra de reconciliação na perspectiva do ideal evangélico da caridade, que propôs Cristo aos seus seguidores e a todos os homens, e é o único a poder resolver as contradições inerentes à fenomenologia social da desunião, das discórdias, da injustiça e do conflito armado.

Aos vossos colaboradores e fiéis chegue, por vosso meio, uma chamada à esperança, que os sustente nas difíceis circunstâncias actuais e os ajude no cumprimento dos próprios deveres.

Sobre vós, Veneráveis Irmãos, e sobre os amadíssimos filhos da Nação inteira imploro de Cristo Salvador, "nossa paz e reconciliação", abundantes graças divinas, em penhor das quais concedo de coração uma especial Bênção Apostólica.

Vaticano, 6 de Agosto de 1982

JOANNES PAULUS PP. II



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