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VISITA PASTORAL A PALERMO (SICÍLIA)
20-21 DE NOVEMBRO DE 1982

DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
 AOS PROFESSORES E ESTUDANTES
DA FACULDADE DE TEOLOGIA DE PALERMO

Domingo, 21 de Novembro de 1982

 

Senhor Cardeal,
Venerados Irmãos no Episcopado
Reverendo Reitor,
Ilustres Professores e caros Estudantes

1. Estou verdadeiramente feliz de a permanência em Palermo me consentir o encontro com a Faculdade Teológica da Sicília, estabelecendo um pessoal contacto com as Autoridades Académicas, o Corpo Docente, os da Direcção, os Estudantes, os Auxiliares e os Amigos dela, num clima de cordial familiaridade e de caloroso empenho.

Estão presentes também Professores e Estudantes dos Institutos Teológicos "Ignatianum" e "S. Tomás" de Messina; "S. Paulo" de Catânia; e de outras escolas teológicas sicilianas. Ao dirigir o meu agradecimento ao Reitor pelas cordiais palavras de boas vindas, saúdo a todos com efusão de sentimento, bem conhecendo a vossa entusiasta dedicação por uma promitente actividade académica da vossa Faculdade Teológica, erecta há dois anos pela Santa Sé, mas fruto de longa preparação por parte do vosso venerado Grão-Chanceler, o Cardeal Salvatore Pappalardo, Arcebispo de Palermo, dos Bispos da Região e de beneméritos e qualificados Sacerdotes.

As Autoridades Civis, sensíveis à importância da iniciativa, ofereceram o seu apoio, contribuindo de maneira concreta e eficaz para a sua realização.

A minha presença no meio de vós, quer ser expressão de apreço e de confiança para com esta instituição académica que, inserida no vivo contexto da realidade eclesial e civil da Ilha, não deixará de prestar serviços insubstituíveis, em ordem à formação científica de tantos pastores de almas, e ao aperfeiçoamento de uma esclarecida consciência cristã do Povo de Deus.

2. A jovem Faculdade Teológica, com efeito, surgiu da advertida necessidade de qualificar academicamente o ambiente teológico siciliano, em pleno ardor de renovação, depois do Concílio Vaticano II. Deste modo ela encontra o seu lugar na família dos centros italianos de estudos eclesiásticos, assumindo a responsabilidade de compartilhar as tarefas que a Igreja lhe indica: a investigação teológica, a docência-formação, e um específico empenho na obra de evangelização (cf. Const. Apost. Sapientia Christiana, art. 3).

A primeira tarefa diz respeito, então, à aprofundada consciência cientifica, à enucleação sistemática e à adequada apresentação da Revelação cristã aos homens do nosso tempo. Como vedes, é um trabalho rico de grandes perspectivas, no qual o dado revelado interpela a fundo a cultura contemporânea para se realizar um frutuoso encontro entre a fé e a ciência. Uma Faculdade de teologia é lugar qualificado deste encontro, é lugar privilegiado do grande diálogo entre a Igreja e o Mundo, que exige, para um correcto desenvolvimento, pessoas de profunda ciência teológica e, ao mesmo tempo, abertas às instâncias de hoje, a fim de as interpretar à luz da Palavra divina.

Dado que o conteúdo da mensagem revelada é essencialmente "Mistério", dai deriva que a "Verdade" se apresenta sempre ao homem com interrogantes quesitos, e permanece portanto a necessidade e a constante preocupação de a esclarecer, de a determinar e de a anunciar depois, de modo apropriado e actualizado; com convicção, consciência e competência.

O centro académico tem em seguida, como segunda finalidade, o ministério da docência-formação: é preciso comunicar aos outros o resultado do trabalho do pesquisador. E não se trata só de fazer que o aluno participe, mas também seja introduzido no método do rigoroso estudo em campo teológico, formando assim jovens pesquisadores e jovens professores. Além disso, devido às próprias exigências metodológicas que diferem daquelas das ciências humanas, a teologia requer que os professores sejam exemplares no respeito da Palavra de Deus, na sua investigação amorosa e humilde, na fidelidade às indicações do magistério, envolvendo em tais atitudes espirituais os próprios alunos.

Enfim, a Faculdade está inserida no vivo contexto da Igreja local que a sustém e a interroga para as próprias necessidades de evangelização. Surgem, assim, as várias especializações teológicas, como idóneos instrumentos para se tratar de específicas instâncias de um determinado ambiente eclesial. Como a Igreja, também a Faculdade está empenhada a fundo na obra de evangelização; para tanto, ela prepara o pessoal mais qualificado e enfrenta as problemáticas da mencionada obra. Numa palavra, nesta última finalidade pode determinar-se toda a razão de ser de uma Faculdade teológica regional.

Vós bem conheceis, juntamente com as virtudes tradicionais da vossa gente, as dificuldades que se apresentam no seu caminho cristão, e vos propondes estudá-las de modo crítico e metodológico, à luz do Evangelho, para oferecer indicações pastorais críveis e válidas. Tal estudo comporta o aprofundamento dos múltiplos aspectos da cultura siciliana, gloriosa por tantos sentidos; e constitui, por isso, também um testemunho de amor para com a vossa Ilha, aliás, terreno de encontro das grandes culturas vizinhas, grega e árabe, que deixaram marcas profundas na fisionomia siciliana.

Na perspectiva de tal aproximação às vossas raízes históricas e às culturas que passaram ao longo da vossa Terra, insere-se a peculiar relação com o Oriente cristão. A Faculdade teológica da Sicília, herdeira de relações jamais interrompidas com aqueles Irmãos Separados, apresenta-se deste modo como sede privilegiada de diálogo, para um melhor conhecimento reciproco e mútua compreensão, na grande perspectiva da oração de Cristo "Ut omnes unum sint" (Jo 17, 21).

3. Desejo agora dirigir-vos uma palavra referente à peculiar característica eclesiológica, estatutariamente definida, da vossa Faculdade (cf. Estatutos, art. 1, 4).

A atenção à Igreja, e à Igreja como lugar teológico, foi certamente prevalente nos Padres do Concilio Ecuménico Vaticano II. Não ao acaso, abrindo os trabalhos da II sessão, o Papa Paulo VI afirmou entre outras coisas: "Cremos ter chegado a hora em que a verdade acerca da Igreja de Cristo há-de ser aprofundada, ordenada e expressa... E Nós julgamos que neste Concílio o Espírito de verdade iluminará o corpo docente da Igreja sobre a doutrina relativa à sua própria essência..." (Insegnamenti di Paolo VI, I, p. 173).

A indagação acerca da íntima essência da Igreja, e da sua missão salvífica, necessita sempre de posterior, fiel e corajoso empenho, pelo que a escolha da eclesiologia como chave interpretativa de toda a teologia, justifica completamente a vossa especialização, abrindo-lhe um campo de pesquisa de palpitante actualidade.

A Igreja, de facto, é a Verdade salvífica, porque a Igreja é o próprio Cristo presente no tempo com a sua Palavra e a sua obra redentora. Deus, Verdade por essência, manifestando-se ao homem na sua mesma história, mediante a Encarnação, devia necessariamente revelar-se como Verdade: "Eu sou a Verdade" (Jo 14, 6); "Eu sou a Luz do mundo. Quem Me segue não andará nas trevas" (Jo 8,12), diz Jesus. "A Graça e a Verdade vieram por meio de Jesus Cristo" (Jo 1, 17) afirma o Apóstolo-Teólogo.

De outra parte, a mensagem de Verdade salvífica, porque perene e universal, devia ser garantida e defendida — uma vez concluída a breve passagem de Cristo na história humana — por uma instituição visível e "organizada". A Igreja, por isso, existe unicamente para a Verdade e para a Salvação.

Especialmente nestes tempos, em que a incredulidade perturba as consciências, mais do que nunca é actual e urgente o estudo acerca da origem, natureza, missão, anseios pastorais e ecuménicos da Igreja, bem convictos de que a Verdade deve ser necessariamente "única" e "salvífica". Hoje, é de primordial importância uma clara e convincente "apologética eclesial", que faça compreender com certeza que a Igreja é de facto, ao mesmo tempo, o "lugar teológico" de base, e também o "lugar hermenêutico", destinado não só a esclarecer as mentes, mas também a confirmá-las naquela que é certamente a Vontade reveladora e redentora do Altíssimo.

Concluirei esta breve reflexão sobre as tarefas específicas da vossa Faculdade, com o que eu disse recentemente em Salamanca: "Não se pode acreditar em Cristo, sem acreditar na Igreja, Corpo de Cristo; não se pode acreditar com a fé católica na Igreja, sem acreditar no seu irrenunciável Magistério" (Discurso na Pontifícia Universidade, n. 5). A fidelidade a Cristo, à Igreja e ao Magistério é uma mesma e indivisível fidelidade.

Façamos nossa, então, a fervorosa prece muitas vezes recitada pelo grande Cardeal John H. Newmann, ligado por especiais vínculos a esta cidade de Palermo, testemunha da mais pura tradição católica: "Não permitais, ó Senhor, que eu jamais esqueça, mesmo por um instante, que... a Igreja é a Vossa obra, a Vossa instituição, o Vosso instrumento; ... que, quando a Igreja fala, sois Vós que falais. Não permitais que a debilidade dos Vossos representantes me induza a esquecer que sois Vós que falais e agis por meio deles" (Meditations and Devotions, Longmans, 1960, p. 291).

4. Caros Professores e Estudantes, o campo do vosso trabalho é vasto, as perspectivas são promitentes. Dirigi atentamente o olhar para as necessidades do vosso povo siciliano e pensai em servi-lo, levando-lhe a verdadeira salvação na Pessoa e na Mensagem de Cristo, mediante a Sua Igreja.

O Mistério da Igreja não é compreensível senão na óptica da missão; o estudo da teologia é um só todo com o empenho pastoral. Não penseis em poder trabalhar com proveito, prescindindo daquilo de que deveis nutrir-vos, porque todo o empenho resultará estéril se não for alimentado pela penetração existencial da "Verdade-Mistério", realizada, a saber, com a inteligência, com o coração, com profunda paixão pela Palavra de Deus, pela Tradição eclesial, pela Teologia, ao mesmo tempo ciência e sabedoria.

De outra parte, não se aspira a ser sábio para si mesmo, mas para participar na solicitude missionária e pastoral da Igreja de Cristo, e de modo particular da Igreja que está na Sicília.

A Mãe de Cristo, a Virgem Odigitria por vós tão venerada, vos assista e vos conduza ao profundo conhecimento do seu Filho, cuja Realeza Universal hoje celebramos de modo solene, para que possais comunicar este sublime conhecimento a um povo também ele real e sacerdotal.

No nome de Cristo Rei, a Quem são dados glória e poder para todo o sempre (cf. Apoc 1, 6), encorajo todos vós a este trabalho científico e pastoral, e de coração concedo-vos a minha Bênção Apostólica.

 



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