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 DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
AO SENHOR IVAN BUCARO HURTARTE
NOVO EMBAIXADOR DA GUATEMALA
JUNTO DA SANTA SÉ

5 de Novembro de 1998

 

Senhor Embaixador

1. É como grande prazer que recebo as Cartas Credenciais, que o acreditam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República da Guatemala junto da Santa Sé. Enquanto lhe dou as minhas cordiais boas-vindas neste acto solene, quero expressar mais uma vez o sincero afecto que sinto por todos os filhos e filhas dessa nobre Nação, tão rica culturalmente e com a qual a natureza foi tão pródiga. Agradeço-lhe profundamente a deferente saudação que houve por bem transmitir-me da parte do Senhor Presidente da República, Dr. Álvaro Arzú Irigoyen, assim como as amáveis expressões para com esta Sé Apostólica e a minha pessoa, as quais testemunham também os filiais sentimentos do povo guatemalteco. Peço-lhe que tenha a bondade de fazer chegar a Sua Excelência o meu sincero agradecimento.

2. Recordo com muita emoção as duas Visitas pastorais que tive a alegria de realizar ao seu País, em Março de 1983 e Fevereiro de 1996. Volta à minha mente o caloroso acolhimento com que milhares de guatemaltecos quiseram manifestar também os seus anseios de paz e o ardente desejo de ver terminada a guerra fratricida. Por isso, recordando o apelo dos meus Irmãos Bispos da Guatemala, eu dizia: «Urge a verdadeira paz. Uma paz que é dom de Deus e fruto do diálogo, do espírito de reconciliação, do compromisso sério por um desenvolvimento integral e solidário de todas as camadas da população e, especialmente, do respeito pela dignidade de cada pessoa» (Discurso no Aeroporto La Aurora, 5/1/96, 4). Após longas e difíceis negociações, a Providência quis que no dia 29 de Dezembro daquele mesmo ano fossem assinados os Acordos de Paz firme e duradoura, acto corajoso que encheu de grande alegria e esperança os guatemaltecos, a Comunidade internacional e, de modo particular, esta Sé Apostólica, dando graças ao Príncipe da Paz por esse dom precioso, que eu mesmo havia implorado, em particular com a minha peregrinação ao Santuário do Cristo Negro, o Senhor de Esquipulas.

3. Ao terminar o século XX abrem-se à humanidade novos cenários de liberdade e esperança, infelizmente conturbados com frequência por situações políticas instáveis, estruturas sociais débeis e conflitos preocupantes. Hoje, ante estes horizontes esperançosos em que a «lógica da guerra» resulta mais absurda que nunca, está a progredir a interdependência entre os povos. Razão por que, é necessário e urgente trabalhar pela construção de uma ordem interna e internacional que promova a convivência pacífica, a cooperação, o respeito pelos direitos fundamentais dos homens e dos povos, reconhecendo a centralidade de cada pessoa e a sua inviolável dignidade. Vejo com alegria que na Guatemala se vislumbram também esses novos horizontes, que convidam a intensificar os esforços para continuar a construção de uma sociedade renovada e mais solidária. Vossa Excelência, Senhor Embaixador, referiu-se ao papel da Igreja católica que, de maneira constante e abnegada, às vezes com incompreensões, ofereceu a sua valiosa contribuição durante o longo processo de pacificação do seu País. Numerosos têm sido os apelos à reconciliação e ao perdão, feitos pelos Bispos guatemaltecos. A respeito disso, o Grande Jubileu do Ano 2000 oferece uma oportunidade singular para realizar essa reconciliação e consolidar assim os acordos alcançados com tanto esforço. Este seria o melhor tributo que o seu País pode prestar àqueles que despenderam generosamente as suas vidas ou, inclusive, derramaram o seu sangue por objectivos tão nobres e sublimes.

4. A Igreja na Guatemala, consciente da sua grave responsabilidade na hora presente e fiel à sua missão religiosa, moral e social, sem renunciar à sua legítima autonomia, está disposta a continuar a «sadia colaboração» com as autoridades e as diversas instituições do Estado e da sociedade guatemalteca, a fim de promover e apoiar todas as iniciativas destinadas à realização do maior bem da pessoa, da sociedade e sobretudo da família, santuário do amor e da vida (cf. Centesimus annus, 39). Alheia a interesses puramente temporais, a Igreja continuará a anunciar a Boa Nova da salvação, disposta a dar a sua generosa contribuição em sectores tão importantes para o desenvolvimento integral da pessoa, como são a educação, a saúde, a defesa e promoção dos direitos e liberdades fundamentais de todos, assim como a sua incansável actividade caritativa ao serviço dos mais necessitados. Vossa Excelência recordou também que é preciso continuar a evangelizar para construir uma sociedade mais justa, fraterna e solidária, se quisermos que a concepção cristã da vida e os ensinamentos morais da Igreja continuem a ser elementos essenciais, que inspirem as pessoas e os grupos que trabalham pelo bem da Nação. Ao receber os Bispos do seu País durante a Visita «ad Limina » de 1994, referindo-me ao documento colectivo do Episcopado, intitulado «500 anos semeando o Evangelho», dizia-lhes: «A nova evangelização dever á, portanto, preservar as riquezas espirituais do vosso povo e favorecer em todos uma conversão cada vez mais coerente com o Evangelho» (4/3/94, n. 2). Só à luz do Evangelho se podem encontrar soluções para obter «um desenvolvimento autêntico do homem e da sociedade, que respeite e promova em toda a sua dimensão a pessoa humana» (Sollicitudo rei socialis, 41). Uma sociedade sem valores fundamentais e sem princípios éticos vai-se deteriorando progressivamente.

5. É grato constatar os esforços do seu Governo por melhorar as condições e qualidade de vida dos guatemaltecos, assim como os êxitos já obtidos. Este é um serviço à dignidade humana, que necessita o apoio de todos os grupos sociais, para continuar a lançar as bases de uma sociedade cada vez mais justa. É desejo comum ver quanto antes na Guatemala uma sociedade em que os direitos da pessoa e das comunidades sejam cada vez mais tutelados e garantidos; que se fomente o espírito de participação, superando os interesses de partido ou classe; que exista um maior acesso à propriedade da terra para aqueles que carecem de recursos económicos; que o imperativo ético seja um ponto de referência iniludível para todos os guatemaltecos; que se realize uma distribuição mais equitativa das riquezas; numa palavra, que todos, pensando no bem do País, desenvolvam a sua vocação humana e cristã, e os diferentes grupos étnicos que compõem o rico mosaico de culturas nessa Nação aprendam a viver em harmonia e respeito mútuo.

6. Causou muita tristeza à Comunidade eclesial, especialmente à guatemalteca, o execrável assassinato de D. Juan José Gerardi Conedera, Bispo Auxiliar da Cidade da Guatemala, que tanto trabalhou pela pacificação do seu País e pelo reconhecimento e defesa dos direitos humanos. Como já expressei naquela triste ocasião, espero que esta tragédia «mostre claramente a inutilidade da violência e leve todos a comprometerem-se na busca do entendimento e do diálogo, único caminho que assegura justiça sobre qualquer obstáculo e provocação», e que não perturbe de modo algum a aplicação dos Acordos de paz». Espero ardentemente que a Guatemala, depois de ter experimentado na sua própria carne tanto sofrimento, destruição e morte, que marcou profundamente as novas gerações, consiga passar quanto antes dessa «cultura da morte» para a «cultura da vida»; da «cultura do medo» para a «cultura da liberdade na verdade». O desejo do povo guatemalteco de conhecer a verdade sobre este e outros crimes responde ao seu legítimo anseio de jamais ter que viver oprimido pela insegurança, o medo e a impunidade, mas sim numa sociedade renovada, na qual a paz firme e duradoura esteja fundamentada sobre a tolerância, a justiça, a liberdade e amor solidário.

7. Senhor Embaixador, antes de concluir este encontro desejo exprimir-lhe a minha sincera estima e assegurar-lhe o apoio da Santa Sé, para que possa desempenhar de maneira frutuosa a alta missão que hoje inicia. Ao mesmo tempo, peço-lhe de novo que tenha a bondade de fazer-se intérprete dos meus melhores sentimentos junto do seu Governo e demais instâncias do seu País, enquanto invoco a bênção de Deus sobre Vossa Excelência e os seus familiares, sobre os colaboradores e todos os amadíssimos filhos e filhas da nobre Nação guatemalteca.

 

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