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DISCURSO DO PAPA PIO XII
AO SENHOR JOSÉ NOSOLINI PINTO OSÓRIO DA SILVA LEÃO
 NOVO EMBAIXADOR DE PORTUGAL
JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO
DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS (*)

Quinta-feira, 23 de Novembro de 1950

 

Senhor Embaixador!

Com singular aprazimento escutámos as nobilíssimas expressões, em que Vossa Excelência traduziu os íntimos sentimentos que o animam pessoalmente ao entregar-Nos as Credenciais, que o acreditam na alta missão de Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República Portuguêsa, e os sentimentos que animam o seu Govêrno, na constante preocupação de manter e estreitar cada vez mais as amigaveis relações com a Santa Sé, pela actuação prática da letra e do espírito da Concordata e do Acôrdo Missionário.

Os primeiros abonam plenamente a confiança depositada em Vossa Excelência pelo Excelentíssimo Senhor Presidente da República, confiança aliás sobejamente garantida pelas eminentes qualidades demonstradas no brilhante exercício de funções precedentes.

Os segundos honram a um Govêrno que soube perfeitamente valorizar as mais lídimas e gloriosas tradições do seu povo; o qual desde a infância da nacionalidade, para mais seguro entrar e crescer no convívio das Nações soberanas, se apoiou á Rocha indefectivel de verdade, onde se alicerça a Igreja; e depois se lhe manteve tão constantemente fiel através dos séculos, como o demonstrava « o Desejado » pouco antes de dar a vida pela dilatação da Fé, quando á Santidade de Pio V que lhe oferecia escolher um título, respondeu, que não queria nem para si nem para o seu povo outro título senão o de filho dedicado da Sede Apostólica (cfr. Vieira, Sermões, v. 7 ['908] p. 71 v. 7), e como atesta o título efectivamente outorgado, um século mais tarde, de Fidelíssimo.

Nem a vocação missionária afrouxou esta intimidade de relações, senão que a estreitou mais. Pois que apenas a Nação Portuguêsa se abalançou a descobrir novas terras para nelas implantar a Cruz, o seu primeiro cuidado foi oferecer ao Vigário de Cristo as primícias daquêles « cristãos atrevimentos » (Camões, Lusíadas, VII, 14) numa embaixada memoravel, que Nós mesmo, ha poucos anos, com prazer recordávamos, quando, ao decretarmos a auréola da santidade a um heróico Missionário, glória de Portugal, acolhíamos outra embaixada, ainda mais memoranda, pois Nos apresentava os preciosos frutos da evangelização portuguêsa em meio mundo.

É nestas gloriosas e sempre vivas tradições que vem inserir-se a nomeação de Vossa Excelência para o seu alto cargo, como novo atestado das amigaveis relações do Govêrno Português com a Santa Sé a acrescentar a tantos recebidos anteriormente e ainda ha pouco na renúncia que, para melhor servir os superiores interêsses da Paz do Mundo, se impôs: acto cuja nobreza a Santa Sé não pôde deixar de apreciar altamente.

Vossa Excelência inicia a sua alta missão em pleno Ano Santo, numa hora extraordinariamente rica de esperanças, porque iluminada com os benéficos esplendores da última, fulgidíssima gema engastada na celestial coroa da excelsa Mãe de Deus.

Confiamos que ambas as circunstâncias hajam de contribuir eficazmente para facilitar e tornar eminentemente profícua a sua elevada acção.

O Ano Santo, que Portugal tem vivido com tão intensa participação, assim pelas numerosas peregrinações vindas a Roma e representando todas as classes da sociedade e todas as províncias do império, como também pelas férvidas manifestações de fé e piedade a que tem dado lugar em todas as dioceses do país, contribuirá certamente para avivar em todos a conciência cristã dos próprios deveres, assegurando-lhes assim, com a bénção de Deus, os frutos da ordem, da tranquila actividade e da paz.

E esta Nossa confiança cresce com a certeza da materna proteção da augusta «Regina Mundi », cuja gloriosa Assunção foi dos privilégios da Mãe de Deus talvez o mais venerado pela Terra de Santa Maria, desde o bêrço, como atestam os mais antigos documentos históricos e litúrgicos com todas as vetustas catedrais consagradas á sua honra, desde a vetustíssima Sé de Braga, protótipo de antiguidade, até à de Faro e até à do Funchal encastoada na « pérola do Atlântico »; e como demonstram os numerosíssimos santuários disseminados em todo Portugal e os que Portugal disseminou nas quatro partes do mundo, com o título de Assunção ou com os de Nossa Senhora da Boa Morte, Nossa Senhora da Guia, Nossa Senhora da Glória. E não seria indício de que á Rainha dos ceus era grato êste culto, o facto de que muitos feitos decisivos na história de Portugal coincidiram com as festas da Assunção, como, por exemplo, Aljubarrota, que assegurava a independência, e Ceuta que dava princípio á cruzada de além-mar e onde Nossa Senhora de África ficava para lhe abençoar a vocação missionária?

Considerada internacionalmente a hora presente é cheia de trepidações e perigos, e o futuro de obscuras incertezas. O anseio mais sentido e mais universal dos povos é a paz. Pela paz e concórdia entre as Nações continuará a Santa Sé a trabalhar indefèssamente, sem desconfiar da prudência e da boa vontade dos Governantes, sôbre quem pesa a tremenda responsabilidade do bem estar da humanidade, mas confiando sobretudo no auxílio do alto, na assistência do eterno Príncipe da paz e na intercessão da Virgem potentíssima.

Praza ao Ceu que a Nação fidelíssima, por especial protecção da Mãe de Deus e pela clarividente prudência dos seus Governantes preservada do passado, imane conflito, possa continuar tranquilamente na sua carreira de pacífico progresso e na sua missão pacificadora e missionária, dilatando ao longe a fé e contribuindo para o ressurgimento do espírito de fraternidade entre as Nações e para apressar o advento da verdadeira paz. Queira Vossa Excelência transmitir ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República, ao ilustre Chefe e aos Membros do Govêrno êstes Nossos paternos votos pela paz e prosperidade da Nação Portuguêsa; em quanto Nós fèrvidamente imploramos sôbre todos os Nossos queridos filhos de Portugal — continental, insular e ultramarino — as mais selectas graças e favores do Ceu.


(*) Discorsi e Radiomessaggi di Sua Santità Pio XII, vol. XII, pág. 329-331.

AAS 43 (1950), p.823-825.

L’Osservatore Romano 24.11.1950 p.1.

 



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