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CARTA DO PAPA FRANCISCO
AOS IRMÃOS E IRMÃS JUDEUS DE ISRAEL 

Estamos a viver num tempo de doloroso tormento. As guerras e as divisões estão a aumentar em todo o mundo. Estamos de facto, como disse há algum tempo, numa espécie de “guerra mundial aos pedaços”, com graves consequências para a vida de muitas populações.

Infelizmente, também a Terra Santa não foi poupada a esta dor e, desde 7 de outubro, está mergulhada numa espiral de violência sem precedentes. O meu coração fica dilacerado ao ver o que está a acontecer na Terra Santa, pela força de tanta divisão e ódio.

O mundo inteiro olha para o que está a acontecer naquela Terra com apreensão e tristeza. São sentimentos que exprimem uma proximidade e um afeto especiais pelos povos que habitam a terra que testemunhou a história da Revelação.

Infelizmente, porém, é preciso dizer que esta guerra produziu também na opinião pública mundial atitudes de divisão, que por vezes se traduzem em formas de antissemitismo e de antijudaísmo. Não posso deixar de reiterar o que os meus Predecessores também afirmaram claramente em várias ocasiões: a relação que nos une a vós é especial e singular, sem nunca obscurecer, naturalmente, a relação que a Igreja tem com os outros e o compromisso para com eles. O caminho que a Igreja empreendeu convosco, antigo povo da aliança, rejeita todas as formas de antijudaísmo e antissemitismo, condenando inequivocamente as manifestações de ódio contra os judeus e o judaísmo como um pecado contra Deus. Juntamente convosco, nós, católicos, estamos muito preocupados com o terrível aumento dos ataques contra os judeus em todo o mundo. Esperávamos que “nunca mais” fosse um refrão ouvido pelas novas gerações, mas agora vemos que o caminho a seguir exige uma cooperação cada vez mais estreita para erradicar estes fenómenos.

O meu coração está próximo de vós, da Terra Santa, de todos os povos que a habitam, israelitas e palestinianos, e rezo para que o desejo de paz prevaleça sobre todos. Quero que saibais que estais perto do meu coração e do coração da Igreja. À luz das numerosas comunicações que recebi de vários amigos e organizações judaicas de todo o mundo e da vossa carta, que muito aprecio, sinto o desejo de vos assegurar a minha proximidade e o meu afeto. Abraço cada um de vós, e especialmente aqueles que estão consumidos pela angústia, pela dor, pelo medo e até pela raiva. As palavras são tão difíceis de formular diante de uma tragédia como a que ocorreu nestes últimos meses. Juntamente convosco, choramos os mortos, os feridos, os traumatizados, suplicando a Deus Pai que intervenha e ponha fim à guerra e ao ódio, estes ciclos intermináveis que põem em perigo o mundo inteiro. De uma forma especial, rezamos pela libertação dos reféns, regozijando-nos por aqueles que já regressaram a casa e rezando para que todos os outros se lhes juntem em breve.

Gostaria ainda de acrescentar que nunca devemos perder a esperança numa paz possível e que devemos fazer tudo para a promover, rejeitando todas as formas de derrotismo e desconfiança. Devemos olhar para Deus, a única fonte de esperança certa. Como disse há dez anos, «a história ensina-nos que as nossas forças não são suficientes. Mais de uma vez estivemos à beira da paz, mas o maligno, utilizando vários meios, conseguiu bloqueá-la. É por isso que estamos aqui, porque sabemos e acreditamos que precisamos da ajuda de Deus. Não abdicamos da nossa responsabilidade, mas invocamos Deus num ato de suprema responsabilidade perante as nossas consciências e perante os nossos povos. Ouvimos um apelo e temos de responder. É o apelo a quebrar a espiral do ódio e da violência, e a quebrá-la com uma palavra: a palavra “irmão”. Mas, para poder pronunciar esta palavra, é preciso levantar os olhos para o céu e reconhecermo-nos filhos de um só Pai » (Jardins do Vaticano, 8 de junho de 2014).

Em tempos de desolação, temos grande dificuldade em ver um horizonte futuro em que a luz substitui a escuridão, em que a amizade substitui o ódio, em que a cooperação substitui a guerra. No entanto, nós, como judeus e católicos, somos testemunhas de um tal horizonte. E temos de o fazer, começando, em primeiro lugar, na Terra Santa, onde juntos queremos trabalhar pela paz e pela justiça, fazendo tudo o que estiver ao nosso alcance para criar relações capazes de abrir novos horizontes de luz para todos, israelitas e palestinianos.

Judeus e católicos, devemos empenhar-nos neste caminho de amizade, solidariedade e cooperação na busca de formas de reparar um mundo destruído, trabalhando juntos em todas as partes do planeta, e especialmente na Terra Santa, para recuperar a capacidade de ver no rosto de cada pessoa a imagem de Deus na qual fomos criados.

Ainda temos muito a fazer juntos para garantir que o mundo que deixaremos aos que virão depois de nós seja um mundo melhor, mas estou confiante de que podemos continuar a colaborar juntos para este objetivo. 

Abraço-vos fraternalmente.

Francisco



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